Os termos Globalização, transnacionalismo, multiculturalismo… tão falados hoje em dia , são realmente muito antigos. É necessário, pensar processos e politicas que inevitavelmente “cavam distancias, abrem fossos e grandes discrepâncias entre ricos e pobres”. Há no entanto um aspecto que me parece importante. A questão do individuo enquanto “elo mais fraco” neste, ainda, enigmático processo e o modo com ele se tem considerado enquanto ser social ao longo dos tempos. Afinal é por ele e para ele que tudo se processa.
O individuo enquanto ser social é co-responsável por toda esta bola de neve que envolve o modo de entender a diferença e como se tem construído o pensamento sobre a mesma. O Individuo é vitima e vitimiza simultaneamente. Ao longo dos séculos o individuo vê-se ( ou não vê) a si mesmo de diferentes formas .
Começando pela pré-história onde predominava o instinto de sobrevivência, a humanidade sente necessidade de justificar a sua existência através de explicações teológicas/mitológicas, uma vez que, não tinha a capacidade de se perceber. Individualista pelas circunstâncias, começam a pouco e pouco a ter a percepção de que funcionar em grupo é, de facto, algo que pode ser benéfico. A partilha característica da vida comunitária acarreta benefícios práticos, facilitando a sua permanência no mundo, copiando e adoptando modos de vida. Ou seja aprendendo com os outros….
Na idade média, vira-se para Deus as figuras mitológicas de outrora centram-se apenas num único ser que tudo explica e que tudo compreende, DEUS , não deixando de ser igualmente uma figura simbólica onde são depositadas todas as explicações para o que não se consegue AINDA compreender. Esta perspectiva assenta sobre bases sólidas, materiais e contem uma visão pessimista em relação à natureza humana, uma vez que tudo era submetido a lei de Deus. No entanto, luta pelos seus interesses materialistas, estando já, nesta fase, a criar distanciamento e cavando fosso entre o que é pior e o que é melhor e de certa forma começa a transparecer a sua vertente elitista. Surgem as classes sociais: povo, o clero e a nobreza, designações unicamente sustentadas pelo poder económico e politico de cada individuo.
No Renascimento há um viragem na mentalidade humana:
“Posso sorrir e matar enquanto sorrio, e proclamar-me feliz com o que me aflige o coração, Molhar as minhas faces com lágrimas fingidas e comandar a minha cara a todas as ocasiões… Posso acrescentar cores ao camaleão, mudar de forma mais depressa que Proteu e mandar para a escola o sanguinário Maquiavel”. Leonardo Davinci
A perspectiva humanista considera, “que obra de arte é o homem: tão nobre no raciocínio; tão vário na capacidade; em forma e movimento, tão preciso e admirável, na acção é como um anjo; no entendimento é como um Deus; a beleza do mundo, o exemplo dos animais.” Hamlet, William Shakespeare
Finalmente nesta nova concepção a humanidade começa a ver-se como o centro de todas as questões o que impulsiona o desenvolvimento da ciência , mas a mentalidade castradora subjugada ao nascimento de uma nova classe social detentora de bens materiais (burguesia), mais uma vez, aniquila a capacidade de ver e perceber sem descriminar. O homem pensa-se e dá-se importância, mas de uma forma completamente individualista.
Mais tarde, no Barroco, o individuo fica baralhado, dividido entre duas mentalidades distintas, relativamente à forma de se ver no mundo. A medieval e a renascentista, dedica-se assim à arte de uma forma exacerbadamente ostensiva, lida com o poder económico de uma forma completamente desmedida. Negligencia mais uma vez o pensar sobre si próprio, como um ser social, aproveita o que tem à sua volta, esquecendo o conhecimento do outro, enquanto ser, igualmente social. O fosse é cada vez maior…
No romantismo começa a ter uma visão de si próprio valorizando sentimentos e emoções.
O homem romântico é um herói titânico, combate a opressão das leis, representando os socialmente ostracizados. Convicto que domina a natureza, a vida é para ele um problema insolúvel, o instinto egocêntrico mostra no entanto que é arrastado por força que não consegue controlar, por um cego destino. O que o leva a uma busca incessante pela perfeição e o infinito, com uma inquietação febril, como se de uma melancolia patológica se tratasse por algo que não consegue atingir mas que anseia com todas as suas forças, levando-o a evocar, como Baudelaire, o destino cruel da humanidade – a morte. Olhos fitos num mundo superior que a razão não sabe definir, o romântico começa a idealizar, a fazer de conta. O seu coração inquieto e generoso deixa-se embalar num certo espiritualismo e vai lançar-se no culto da Humanidade, da Pátria, da mulher. Refugia-se no sonho, no fantástico, oscilando entre o pessimismo confessado e os desejos de um contentamento e satisfação sempre longínquos. (http://pt.shvoong.com/books/1692980-homem-rom%C3%A2ntico/)
"O Homem do Século XX deve ser um homem com outra escala de valores, que não seja movido fundamentalmente pelo dinheiro, que acredite na existência de uma medida distinta para a felicidade, na qual a intolerância seja a grande força criadora" Allende
E será que foi? Ou o fosso continuou a ser cada vez maior?
Em jeito de conclusão, atrever-me-ia a referir que o homem do sec. XXI, à semelhança do homem do Barroco, são um único e mesmo homem, perplexo, com dilemas por resolver, dividido entre a consciência do novo mundo e das novas realidades sociais que se apresentam como dado adquirido.
As ideias de humanismo e das grandes descobertas do passado, podem ser comparadas com a conquista do espaço e a evolução cientifica e tecnológica dos dias de hoje ,a contra reforma, a inquisição e o absolutismo de antigamente, com as preocupações relacionadas com a guerra nuclear, o sub-desenvolvimento de países pobres não poderão ser considerados factores comuns ao pensamento da humanidade nestas duas fases da sua existência? ??
Afinal vive-se na angustia no medo na insegurança e na instabilidade quer numa época quer noutra. É neste sentido que faço este retrospectiva na minha reflexão. O Individuo está na base de todas as mudanças, esta envolvido em todos os processos, é causador e causa e vincula, apesar de tudo, a sua faceta individualista, que ao longo dos séculos tem estado na base de todas as controvérsias e problemáticas da sua vida em comunidade.
Helena Francisco